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Revirando as supostas faces ocultas de Freud: uma resposta ao vídeo da Brasil Paralelo

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Freud por Vini Capiotti ( Superinteressante ) O presente texto é uma resposta ao vídeo da Brasil Paralelo intitulado “A face oculta de Sigmund Freud”, recentemente publicado, disponível no YouTube:  Costumo acompanhar os conteúdos da série de faces ocultas com entusiasmo, mas, como médico e psicanalista que sou, devo apontar que o pessoal da Brasil Paralelo pisou feio na bola nesse vídeo sobre Freud. Explico a seguir, comentando seu conteúdo em ordem cronológica. 1. Psicanálise não é psicoterapia , tampouco é psicologia clínica. Embora, ao longo da história, os termos tenham sido aproximados e até utilizados como equivalentes, atualmente são práticas clínicas cujas demarcações teóricas e, consequentemente, práticas diferem bastante, ainda que algumas psicoterapias se apresentem como “de orientação psicanalítica”. Falo um pouco mais sobre essa diferença em artigo publicado outrora neste mesmo blog. 2. A International Psychoanalytical Association (IPA) não é uma unanimidade entre os p

Nós e as perversões

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Na linguagem cotidiana, o termo “perversão” é frequentemente relacionado aos comportamentos sexuais anormais, corrompidos ou depravados. Também é corriqueira a utilização da palavra “perverso” como sinônimo de malvado e cruel. Definições de dicionários, obtidas em qualquer site de busca na internet, corroboram essas afirmações. Para a Psicanálise, no entanto, perversão é um conceito cujo sentido difere daquilo que o linguajar comum lhe atribui. Quem intenciona enveredar-se pelas vias psicanalíticas deve ter clareza de que se trata de um importante conceito e talvez precise esvaziar-se de ideias pejorativas ou estereotipadas a respeito das perversões. É verdade que no começo da obra freudiana, conforme apontam Roudinesco e Plon (1998), quando foi adotada conceitualmente, a perversão ainda era tratada como desvio daquilo que se considerava o padrão ou a norma do comportamento em termos sexuais. Desde aquela época, entretanto, Freud não atribuía a ela um viés depreciativo; ao contrário, e

Os adolescentes e algumas psicoses do nosso tempo

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Teenagers - painting by Alejandro De Jesus | A adolescência é uma fase da vida importantíssima para determinar que adultos seremos. Trata-se de um longo caminho a ser percorrido, sinalizado por diversas mudanças psicossomáticas que, gradativamente, vão demarcando diferenças cruciais entre a criança e o adulto. É uma trilha geralmente difícil de se fazer, permeada por angústias, inquietações, dúvidas e sofrimentos. Assim, muitos jovens buscam ajuda na psicanálise para lidar com o mal estar. E o psicanalista, para bem cumprir sua função, deve estar atento não apenas às especificidades da clínica nessa faixa etária, mas também às características do mundo em que tais sujeitos estão inseridos. Um dos grandes problemas com que nos deparamos atualmente na clínica psicanalítica é aquilo que chamarei, talvez por falta de expressão mais apropriada no momento, de rótulo diagnóstico. Isto é notoriamente prejudicial quando se trata de adolescentes, pois, como indicado acima, eles estão passando po

A masturbação coletiva e os estudantes de Medicina

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Chamou a atenção da mídia recentemente, e causou no mínimo estranheza, o comportamento de jovens, futuros médicos, que durante jogos esportivos da faculdade realizaram um ato de masturbação coletiva. Este tipo de ocorrência não surpreende muito quem já frequentou um curso de Medicina e teve a oportunidade de presenciar que parte dos estudantes costuma agir de modo bizarro e impudente nas festas promovidas pelas famosas “atléticas”, em especial durante os badalados jogos conhecidos como “intermed”, que acontecem entre diferentes faculdades. No entanto, conhecedores ou não desse ambiente talvez estejam ecoando a pergunta: por que isso acontece? Pois bem, vamos pensar sobre e levantar algumas hipóteses aqui. Inicialmente, deve ficar claro que estamos diante de um comportamento de grupo, ou de massa, se quisermos usar o termo consagrado por Freud na obra “Psicologia das massas e análise do Eu”. A propósito, nesse texto ele afirma que um indivíduo no interior de uma massa experimenta, por i

Em tempos de antidepressivos e ansiolíticos, qual o lugar da Psicanálise?

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Foi no meio médico que a Psicanálise surgiu, ainda no final do século XIX, e desde então ela tem sido bastante questionada. Os críticos mais ferozes alegam que psicanálise não funciona e que a ela faltaria o embasamento das evidências científicas. No entanto, apesar dos muitos opositores, incontáveis psicanalistas continuam a se formar e inúmeras pessoas dessa prática a se beneficiar, levando adiante experiências analíticas e testemunhos que mantém a Psicanálise bem viva no mundo contemporâneo. A propósito, um mundo onde não é difícil perceber diferentes formas de mal estar psíquico, que resultam, entre outros problemas, no uso excessivo de psicofármacos. Eis um cenário interessante para pensarmos o lugar da clínica psicanalítica, especialmente o da clínica lacaniana, com seus desafios e perspectivas nos dias atuais. A psicanálise encontrou lugar para florescer nos furos deixados pela clínica médica, e justamente aí segue havendo muito espaço para avançar. Não raro tais furos configura

A psicanálise na canção "Garotos II - O Outro Lado"

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“Garotos II - O Outro Lado” é provavelmente a canção mais conhecida de Leoni e neste ano 2023 completa-se 30 anos de seu lançamento. Ela embalou a adolescência de muitos jovens românticos que tiveram o privilégio de experienciar essa fase da vida durante a década de 90, época na qual, em minha opinião, que lá estive adolescente, o caldeirão musical estava em uma fenomenal e sem igual ebulição criativa. Leoni, na referida canção, capta poeticamente o paradoxo encontro entre drama e encanto que uma jovem mulher pode proporcionar a um jovem que por ela se apaixona: olhos, olhares, truques, confusões, boca, cabelo, peitos, poses, apelos, mistérios, armadilhas. Essa ambivalência torna-se ainda mais dramática na medida em que, ao que parece, enquanto jovens apaixonados são só garotos , tentando apreender algo sobre o impressionante universo feminino que se apresenta a eles com as descobertas sexuais da puberdade, as meninas por quem eles se encantam já são tão mulheres . No texto “A feminil

Uma abordagem psicossomática do transtorno de pânico

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  Palpitações, formigamentos, sudorese, sensações de coração acelerado, falta de ar e morte iminente. São muitos os sintomas e é grande o desconforto experimentado pelos pelas pessoas que sofrem do transtorno de pânico. Todavia, apesar da elevada prevalência desse problema, inclusive em unidades de urgência, é frequente que pacientes com pânico sejam pouco compreendidos e tratados de modo inapropriado na clínica médica. Visando construir uma abordagem diferenciada sobre o pânico, fazendo dialogar conhecimentos da Medicina e da Psicanálise, convidamos um médico psiquiatra e um psicanalista para conversar sobre esse tema. Acesse o vídeo a seguir e confira: Apresentação/Introdução - 00:00:00 a 00:12:20 Entrevista Marcus Bressan Leite - 00:12:21 a 00:37:3 0  Entrevista Vitor Werner - 00:37:3 1 a 01:07:15 Diálogos - 01:07:16 a 01:47:40 ---o--- Artigo utilizado no estudo: Costa VA de SF, Queiroz EF de. Transtorno de pânico: uma manifestação clínica do desamparo. Psicol cienc prof [Interne